[QUADRINHOS] Projeto Manhattan – Volume 1: Ciência. Ruim. (resenha)

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Imagine um mundo em que “Albert” Einstein, Richard Feynman e “Robert” Oppenheimer fizeram parte de um projeto secreto científico-militar que, entre outras coisas, criou a bomba atômica, realizou contatos com alienígenas, e descobriu uma forma de viajar para outros universos. Este é basicamente o cenário de Projeto Manhattan.

projeto-manhattan-jonathan-hickman-nick-pitarra-editora-devir-preview-001Criada pela dupla Jonathan Hickman e Nick Pitarra, com cores de Cris Peter, Projeto Manhattan conta a história de uma versão alternativa do nosso mundo, em que militares e cientistas uniram-se para um empreendimento independente da política dos Estados Unidos. É um tema clássico de histórias sobre conspirações, mas aqui a abordagem é diferenciada.

A série lembra um pouco a premissa da fase dos Novos Vingadores escrita por Hickman, onde o autor também vem explorando a dinâmica entre personagens excêntricos e geniais. Mas ao contrário de seu trabalho para a Marvel, na Image ele encontra mais liberdade para extrapolar suas ideias, que aqui adquirem um tom mais sarcástico e satírico, abraçando o bizarro e o absurdo de um mundo cheio de possibilidades que não respeitam nem a história do nosso, nem as versões reais dos personagens nos quais se baseou para compôr seu elenco. Tudo isto torna a leitura mais divertida (e não há como não gostar do Oppenheimer com múltipla personalidade, que funciona como uma metáfora da fissão nuclear gerada pela bomba atômica que ajudou a criar).

projeto-manhattan-jonathan-hickman-nick-pitarra-editora-devir-preview-002Logo nas primeiras páginas já dá pra notar que a história não se levará totalmente a sério, quando acompanhamos a “entrevista de emprego” entre o General Leslie Groves e Oppenheimer. Enquanto o primeiro explica o que é o Projeto Manhattan, do qual o físico foi convidado a participar, chama atenção a decoração exagerada e intimidadora do escritório do general, que senta-se atrás de uma escravinha cercada de armas e condecorações, sendo o próprio uma autêntica personificação do poderil militar dos Estados Unidos.

A dupla criativa deixa bem claro desde o início que apresentará versões alternativas de personagens e fatos históricos de nosso mundo. Para isto eles usam e abusam de uma miscelânea de referências a conspirações e conceitos de ficção científica, que remetem aos Invisíveis de Grant Morrison e Planetary de Warren Ellis, dois autores que Hickman já admitiu serem influências de seus trabalhos.

Entre os temas abordados pela série estão a dualidade (em seus diversos aspectos e implicações, algo que a capa do encadernado já adianta); as sobreposições entre ciência e religião; maçonaria; inteligência artificial; contatos com alienígenas; universos paralelos; a relação entre colonizadores e colonizados; e a ganância humana por conhecimentos além dos conquistados por si mesma.

projeto-manhattan-jonathan-hickman-nick-pitarra-editora-devir-preview-003Alguns deles chamam atenção, como a versão alternativa criada por Hickman para o lançamento da primeira bomba atômica, que envolve conspiração militar paralela à criação da primeira inteligência artificial do mundo (e esperem pra descobrir de quem foi a mente usada como base pra criá-la!). É muito bem executada, usando a origem do General Groves para justificar o lançamento da bomba “autorizado” pelo Presidente Truman. Trata-se de um amarramento entre história e ficção digno de elogios.

Projeto Manhattan tem a premissa perfeita para Hickman brincar livremente com sua conhecida habilidade de traçar ligações entre eventos distintos. Para isto ele não economiza em referências ligadas a conspirações de nosso mundo, como Roswell, Tunguska, e a teoria de um “governo secreto” que comanda os Estados Unidos (e que possui seu próprio presidente no universo da série). Tudo isto compõe um quadro complexo, mas que jamais se leva totalmente a sério ou confunde o leitor (apesar de reservar ótimas reviravoltas no desenrolar das tramas).

projeto-manhattan-jonathan-hickman-nick-pitarra-editora-devir-preview-005Outro destaque é a história que conta a origem do Einstein do mundo de Projeto Manhattan. Vale reparar na irônica forma do “portal para um mundo melhor”, cuja ideia chega até ele através de um sonho. A “Porta” de Einstein também lembra o monolito de 2001 – Uma Odisseia no Espaço, e o efeito “mercurial” dos portais estelares do filme e das séries de TV Stargate. Além disto, ela também remete ao conceito da Ponte Einstein-Rosen – proposto por Albert Einstein e Nathan Rosen – que descreve um buraco de minhoca, ou seja, uma “ponte” entre um ponto e outro do universo.

Parte da diversão de Projeto Manhattan é proporcionada pelo traço caricato de Nick Pitarra, que tem influência de Geoff Darrow e também lembra um pouco o estilo de Chris Burnham. A combinação de seus desenhos com o roteiro de Hickman funciona muito bem.

projeto-manhattan-jonathan-hickman-nick-pitarra-editora-devir-preview-004Quem também se destaca é Cris Peter, que usa um bem sacado o esquema de cores em todos os flashbacks do encadernado, com o vermelho representando sempre algum mal-agouro. E ajuda bastante que o vermelho, em contraste com o azul, cause em alguns quadrinhos a ilusão de óptica de 3D. Além disto, vale também reparar na maneira discreta como Cris insere as duas cores nos trechos ambientados no “presente” (que na trama é 1942). 

Ainda que seja uma grande brincadeira de Hickman, Projeto Manhattan também conta com a característica sensação de que há um plano maior por trás dos eventos narrados, por mais insólitos que eles pareçam. Parte dela é passada através dos textos que antecedem cada capítulo e funcionam como interlúdio entre a introdução deles e a história principal, todos extraídos de registros de Richard Feynman a respeito do Projeto Manhattan, que agem como teasers do futuro da série em diversos pontos.

Se você gosta da mistura de ficção científica, história alternativa e humor negro, Projeto Manhattan é uma leitura altamente recomendada. Temos aqui um dos trabalhos mais divertidos de Jonathan Hickman, em plena forma e sintonia com Nick Pitarra e Cris Peter. E recomendo passar adiante a dica de leitura, caso goste, para que a série venda bem e tenha a chance de continuar saindo no Brasil. Lá nos Estados Unidos ela já está no 5º volume!

projeto-manhattan-jonathan-hickman-nick-pitarra-editora-devirProjeto Manhattan – Volume 1

Roteiros de: Jonathan Hickman
Desenhos de: Nick Pitarra
Cores de: Cris Peter
Tradução de: Marquito Maia
Número de páginas: 152
Formato: 17 x 26 cm
Encadernação: brochura
Editora: Devir

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nota-4

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